terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Cadeiras

      Puxe uma, sente-se e entenda a história, a praticidade e por que ela é um dos móveis mais presentes em nossa vida.

     Cada modelo de cadeira serve a um propósito. E são muitos os propósitos. Alguns deles bem objetivo, há cadeiras próprias para a conversa na sala de estar, que são diferentes das indicadas para quem, como eu, trabalha sentado à mesa com um computador. Há ainda cadeiras que, conforme a cultura, servem a metas mais subjetivas. A exemplo da cadeira de um rei, que afirma sua soberania sentando-se no trono. Em algumas tribos indígenas latinoamericanas, sentar no banco é um atributo exclusivo do pajé.  

      Poucas coisas são tão humanas quanto o ato de se sentar. Desde que o Homo sapiens ficou de pé, sentiu a necessidade de sentar-se. No momento em que começamos a ter uma atividade intelectual que implica processar algumas coisas, fazemos isso na posição sentada, diz Adélia Borges, jornalista e diretora do Museu da Casa Brasileira, em São Paulo. E que atividade intelectual mais carente de um assento que escrever? Sentado no chão é praticamente impossível rabiscar palavras. A cadeira é tão importante em nosso dia-a-dia que até os astronautas têm as suas, embora só precisem delas como referência, diz Adélia Borges, no livro Cadeiras Brasileiras. Ou seja, no espaço, onde não há gravidade, não é preciso nem possível sentar-se, mas as cadeiras estão lá, para dar um ar de ambiente habitado, em meio àquela esquisitice de botões e luzinhas piscando.

                                                                    História  
              
           A cadeira chegou ao Brasil no século 16, com a vinda dos portugueses. Até então, por aqui, o mobiliário indispensável eram a rede e a esteira indígenas, ambas de fibras vegetais. A novidade demorou a vingar. Durante muito tempo, seu uso esteve restrito a igrejas, conventos, sedes de bispados, palácios de governo e outros lugares requintados. Apenas no século 19 é que as famílias brasileiras passaram a incorporar no mobiliário o jogo de cadeiras, destinado a compor a sala de jantar e as salas ditas de visita. Detalhe: isso valia para as famílias mais ricas. O resto do povo continuou fazendo o que já fazia quando queria descansar as pernas: sentava em bancos, redes ou no chão,mesmo.
         De certa forma,essa função mais requintada foi preservada até hoje, e o jeitinho bem brasileiro de viver de fato privilegia o uso da cadeira em momentos mais formais. Em famílias do interior ou nas casas de pescadores no litoral nordestino, a vida cotidiana acontece no terraço, em tamboretes, banquinhos e, claro, em redes. As cadeiras estão sempre na sala, um lugar, digamos assim, mais nobre para receber a visita. 
         
                                                                                                 
                                                                      A Cadeira Brasileira
     Até o início do século 20, no entanto, tanto a cadeira quanto o resto do mobiliário tinham a cara e o jogo de cintura europeus, mesmo aqueles fabricados aqui. A semelhança não era uma coincidência: o mobiliário nacional copiava mesmo os padrões europeus de acabamento, de materiais e revestimentos o que ainda encarecia sua produção. A arquitetura e o design genuinamente nacionais só floresceram com o desenvolvimento da indústria. Uma coisa leva a outra: os projetos dos novos prédios que surgiram demandaram mobiliário mais adequado. Nada mais natural. Porque o móvel faz parte do ambiente que desenhamos, diz o arquiteto Julio Katinsky, professor da Universidade de São Paulo, ele mesmo autor de desenhos de cadeiras.
Parece banal, mas o projeto de um móvel tão utilizado no cotidiano é uma prova de fogo. Desenhar uma cadeira é quase tão difícil quando projetar uma casa, diz Adélia, parafraseando o arquiteto alemão Mies van der Rohe (1886-1969). Uma das disciplinas, aliás, dos cursos tradicionais de arquitetura no Brasil ensina a desenhar o quê? Uma cadeira. Tem lógica. Ao pensar nos móveis para sua casa,você pode ir ao marceneiro na esquina e tentar criar, ou desenhar com ele, uma estante, uma mesa e até uma cama.Mas uma cadeira não dá para improvisar. Pois é ela quem vai dar sustentação ao seu corpo, é quase uma extensão dele, tem costas, pés. Além disso, já parou para pensar quanto tempo, num único dia, você fica sentado? É daí que vem, aliás, o nome sedentário: do latim sedens,nada mais que sentar.



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